Unbeachtete Momente- Fotografien 1927-1936
(Momentos despercebidos- Fotografias 1927-1936)
Berlinische Galerie, Berlim
11 de Junho a 6 de Setembro 2010
http://www.emiliejouvet.com/
“ Como é possível que o teu avô tenha estado num campo de concentração? “ perguntou desconfiando o meu amigo de Tel Aviv, enquanto passeávamos juntos em Berlim. Como se isso fosse um direito exclusivo dos israelitas...
“ Ele era contra o fascismo. “ respondi de uma forma curta.
“ Ai é?” disse ele. “Como assim?”
“ Pronto, a Eslovénia foi ocupada pelos nazis na altura da Segunda Guerra Mundial...”
Ele ficou calado e eu deparei-me com o facto de nunca ter dado grande importância à questão de o meu vovô ter sido judeu ou não.
O nome dele era Vladimir Kosi, quer dizer que era, sim. Quando recebeu a recompensa do estado alemão, ligou-me para Lisboa a dizer: “Olha, quero comprar-te a melhor máquina fotográfica que existe no mundo.”
Logo a seguir, morreu em paz.
A exposição “Momentos despercebidos-Fotografias 1927-1936”, da fotógrafa alemã Marianne Breslauer, é a primeira retrospectiva da artista a nível internacional, que apresenta ao público no conjunto130 imagens em preto e branco, os documentos incontornáveis duma época da crise económica e social.
Mesmo tendo isso em conta, ela escolhe por seu tema privilegiado as mulheres, auto-confiantes e independentes, o que dá um toque político à sua obra. Ela própria correspondia a esta imagem da “ nova feminilidade” dos anos vinte do século passado, com cabelo curto e os gestos demonstrativos de uma geração de jovens aspirantes à emancipação. Estas mulheres eram curiosas, urbanas, livres de preocupações materiais e usavam plenamente as liberdades oferecidas na altura da modernização da sociedade entre as duas guerras.
Em paralelo, em Paris, uma cidade que ela ia visitar nas suas frequentes viagens pelo mundo, aparecem as “garçonnes”, marcando com a sua presença os “années folles” entre 1919(fim da Primeira Guerra Mundial) e 1929(início da crise). Também elas lutam pela emancipação e a igualdade dos sexos, usando uma forma de “cross-dressing”. Isso reflecte a mutação cultural da representação do género feminino e prefigura a mulher contemporânea. É muito conhecida a história de como a Coco Chanel apareceu uma vez num evento social vestida no fato de homem e assim desafiou os limites impostos ao seu sexo como também à classe a qual ela pertencia(a classe trabalhadora).
O trabalho de fotografa encaixa-se bem neste novo tempo. Ele promete a expressão artística, reconhecimento profissional e até mesmo a independência económica.
A Marianne Breslauer levou duas carreiras na sua vida, uma foi de artista e outra de galerista, quando decidiu de deixar a fotografia de lado e dedicar-se à galeria do seu marido onde teve o mesmo sucesso. Foi amiga de muitos artistas e intelectuais da época entre os quais se distingue, para além da amizade com o Man Ray, a sua misteriosa e pouco explorada relação com a escritora e fotógrafa Annemarie Schwarzenbach(a próposito, a sua exposição esteve este ano no CCB ). Depois de se conhecerem, as mulheres partiram juntas para uma viagem por Espanha no Mercedes branco de miss Schwarzenbach(só para lembrar que não era muito comum as mulheres conduzirem um carro na altura... ) . Marianne disse em homenagem à sua amiga esta frase que atravessa o tempo: “Neither a woman nor a man, but an angel, an archangel. “
É interessante ver a exposição em conjunto com o Museu Judaico que fica à distância de poucos minutos de Berlinische Galerie, ambos no bairro de Kreuzberg. Concebido pelo arquitecto Daniel Liebeskind e aberto desde 2001, tematiza a história social, política e cultural dos Judeus na Alemanha desde o século IV até ao presente. O arquitecto refere-se na apresentação do museu à “nova arquitectura”, entendida como uma abrangente visão da história, dos museus e da relação entre o programa e o espaço arquitectónico. “To summarize this fourfold structure: the first is invisible and irrationally connected star which shines with absent light of individual address; the second is a a cut off of Act 2 of Moses and Aaron” (uma peça do compositor Schöneberg) “which culminates with the non-musical fulfilment of the world; the third is the ever-present dimension of the deported and missing Berliners; the forth is Walter Benjamin's urban apocalypse along the One Way Street” (o livro dedicado à mulher que nunca conquistou).”
Na altura em que visitei Berlim, estava lá também a Judith Butler, a participar na conferência “Performing the Future” com um discurso intitulado “Performative Gender, Precarious Politics- or, Whose Future?”. Ela entende o género como performance, ideia que partilha com as mulheres dos anos vinte.
Como se sabe, Judith Butler rejeitou o prémio da Berlin Pride, dedicado à exemplar coragem civil dizendo: “I must distance myself from this racist complicity. “ A crítica dirige-se ao homonacionalismo anti-imigrante e anti-muçulmano galopante das Marchas de Orgulho internacionais. Aqui não escapam as Marchas de Lisboa ou de Liubliana, a primeira por deixar de fora a vasta população brasileira e a segunda por negar a exploração legalizada dos inúmeros trabalhadores originários da Bósnia no país, enquanto na Alemanha 'o problema' são neste momento os turcos(como também as pessoas de cor ou religião não maioritária), não conseguindo livrar-se do fantasma do passado.
Como se pode esperar, sentia-me em casa em Kreuzberg, o bairro dos imigrantes turcos e artistas emergentes, como também sempre tinha incontornáveis amigos brasileiros em Lisboa ou amigos da ex- Jugoslávia(seja qual for a sua nacionalidade pós-guerra), estes últimos espalhados pelo mundo...
Como se sabe, Judith Butler rejeitou o prémio da Berlin Pride, dedicado à exemplar coragem civil dizendo: “I must distance myself from this racist complicity. “ A crítica dirige-se ao homonacionalismo anti-imigrante e anti-muçulmano galopante das Marchas de Orgulho internacionais. Aqui não escapam as Marchas de Lisboa ou de Liubliana, a primeira por deixar de fora a vasta população brasileira e a segunda por negar a exploração legalizada dos inúmeros trabalhadores originários da Bósnia no país, enquanto na Alemanha 'o problema' são neste momento os turcos(como também as pessoas de cor ou religião não maioritária), não conseguindo livrar-se do fantasma do passado.
Como se pode esperar, sentia-me em casa em Kreuzberg, o bairro dos imigrantes turcos e artistas emergentes, como também sempre tinha incontornáveis amigos brasileiros em Lisboa ou amigos da ex- Jugoslávia(seja qual for a sua nacionalidade pós-guerra), estes últimos espalhados pelo mundo...
Basta lembrar, e através disso estabelecer a ligação entre as duas épocas separadas por quase um século, que o nazismo(e a sua versão global, o fascismo) foi baseado em mitos e na irracionalidade.